"O deus das pequenas coisas" Arundhati Roy (ASA)
Tradução do Inglês por Teresa Casal
A poesia em forma de romance numa das mais belas obras literárias do século XX
"O deus das Pequenas Coisas" é um romance passado na Índia, estado de Kerala, nos anos 60/70 do século XX, onde vamos encontrar uma população que incorporou os hábitos dos colonizadores europeus (a música, a religião, a forma de vestir, o cinema...).
Ao mesmo tempo, conserva ainda a maior parte das suas tradições, hábitos e, inclusive, alguns dos seus tabus ancestrais, tais como: a marginalização dos intocáveis (aqueles que no sistema de castas - estratos sociais - hindu desempenham as tarefas mais abjectas) tendo, por isso, de manter-se à margem dos "tocáveis" para não "contaminá-los".
O marxismo e o cristianismo são as novidades vindas da Europa que ameaçam derrubar esta grande barreira social. Pelo menos teoricamente.
O livro desta autora indiana, em muitos aspectos autobiográfico é, antes de mais, uma história de amor tão pungente como a de "Romeu e Julieta" ou "Abelardo e Heloísa". E das diferentes formas de manifestar o amor numa sociedade onde as barreiras são tantas que as coisas mais importantes ficam sempre por dizer. Onde só as pequenas coisas são mencionadas, num ambiente social onde há que obedecer a normas rigorosas acerca de quem deve ser amado. E quanto. E como.
"O deus das pequenas coisas" é uma paleta de amores proibidos: dois gémeos que se amam com uma intensidade que ultrapassa os laços de sangue, a avó cuja história de amor tem as cicatrizes da violência, a tia-avó que esconde a paixão pelo Reverendo Mullingham sob uma capa de austeridade e repressão, o tio que não ultrapassa o desamor pela sua musa britânica...
E no centro desta teia de amores amaldiçoados está a mãe dos gémeos e seu amor por Velutha, o líder sindicalista intocável - uma dupla ameaça para esta família, dona da fábrica Pickles Paraíso.
A duplamente estigmatizada Ammu, mãe dos gémeos - quer pelo divórcio quer pela entrega a uma paixão, que ameaça pôr em causa a imagem da família perante a sociedade -, aliada a um acidente que vitima a prima idolatrada quando esta se encontra na companhia dos dois irmãos, trará fortes convulsões que vão abalar a infância destas duas crianças.
As repetições e as frases de uma só palavra aumentam consideravelmente a intensidade do texto. Os adjectivos utilizados são enriquecidos porque incorporados em ousadíssimas sinestesias, metáforas e personificações - "O bambu amarelo chorou" ou " Os cotovelos da noite, repousando na água observavam" -, ao mesmo tempo que somos bombardeados com presságios que nos fazem adivinhar o que se vai passar a seguir. Em vários momentos do texto, o sentimento crescente de angústia, no leitor, torna-se quase que insuportável.
As Pequenas Coisas são descritas até ao mais ínfimo pormenor, como que para prolongar ao máximo a durabilidade daqueles momentos preciosos, porque proibidos, obrigando as personagens a agarrarem-se às pequenas coisas, porque tudo pode mudar um dia.
As Grandes coisas têm de ficar latentes para aqueles que sabem nada possuir. Para aqueles que não têm futuro.
Porque são as pequenas coisas que os ligam ao Amor, à Loucura, à Esperança, à Infinita Alegria.
Um livro recomendado para as pessoas que sabem que amar sem limites tem um preço que as pessoas vulgares não estão dispostas a assumir.
Cláudia de Sousa Dias
A poesia em forma de romance numa das mais belas obras literárias do século XX
"O deus das Pequenas Coisas" é um romance passado na Índia, estado de Kerala, nos anos 60/70 do século XX, onde vamos encontrar uma população que incorporou os hábitos dos colonizadores europeus (a música, a religião, a forma de vestir, o cinema...).
Ao mesmo tempo, conserva ainda a maior parte das suas tradições, hábitos e, inclusive, alguns dos seus tabus ancestrais, tais como: a marginalização dos intocáveis (aqueles que no sistema de castas - estratos sociais - hindu desempenham as tarefas mais abjectas) tendo, por isso, de manter-se à margem dos "tocáveis" para não "contaminá-los".
O marxismo e o cristianismo são as novidades vindas da Europa que ameaçam derrubar esta grande barreira social. Pelo menos teoricamente.
O livro desta autora indiana, em muitos aspectos autobiográfico é, antes de mais, uma história de amor tão pungente como a de "Romeu e Julieta" ou "Abelardo e Heloísa". E das diferentes formas de manifestar o amor numa sociedade onde as barreiras são tantas que as coisas mais importantes ficam sempre por dizer. Onde só as pequenas coisas são mencionadas, num ambiente social onde há que obedecer a normas rigorosas acerca de quem deve ser amado. E quanto. E como.
"O deus das pequenas coisas" é uma paleta de amores proibidos: dois gémeos que se amam com uma intensidade que ultrapassa os laços de sangue, a avó cuja história de amor tem as cicatrizes da violência, a tia-avó que esconde a paixão pelo Reverendo Mullingham sob uma capa de austeridade e repressão, o tio que não ultrapassa o desamor pela sua musa britânica...
E no centro desta teia de amores amaldiçoados está a mãe dos gémeos e seu amor por Velutha, o líder sindicalista intocável - uma dupla ameaça para esta família, dona da fábrica Pickles Paraíso.
A duplamente estigmatizada Ammu, mãe dos gémeos - quer pelo divórcio quer pela entrega a uma paixão, que ameaça pôr em causa a imagem da família perante a sociedade -, aliada a um acidente que vitima a prima idolatrada quando esta se encontra na companhia dos dois irmãos, trará fortes convulsões que vão abalar a infância destas duas crianças.
As repetições e as frases de uma só palavra aumentam consideravelmente a intensidade do texto. Os adjectivos utilizados são enriquecidos porque incorporados em ousadíssimas sinestesias, metáforas e personificações - "O bambu amarelo chorou" ou " Os cotovelos da noite, repousando na água observavam" -, ao mesmo tempo que somos bombardeados com presságios que nos fazem adivinhar o que se vai passar a seguir. Em vários momentos do texto, o sentimento crescente de angústia, no leitor, torna-se quase que insuportável.
As Pequenas Coisas são descritas até ao mais ínfimo pormenor, como que para prolongar ao máximo a durabilidade daqueles momentos preciosos, porque proibidos, obrigando as personagens a agarrarem-se às pequenas coisas, porque tudo pode mudar um dia.
As Grandes coisas têm de ficar latentes para aqueles que sabem nada possuir. Para aqueles que não têm futuro.
Porque são as pequenas coisas que os ligam ao Amor, à Loucura, à Esperança, à Infinita Alegria.
Um livro recomendado para as pessoas que sabem que amar sem limites tem um preço que as pessoas vulgares não estão dispostas a assumir.
Cláudia de Sousa Dias
23 Comments:
fiz busca da palavra "livro" e vim parar a este blog. já encontrei tantos livros que me são especiais e que por palavras minhas nunca consigo resumir do que falam. que bom que é encontrar quem o faça e o faça tao bem!
agora aos poucos vou lendo os posts sobre outros tantos livros que não conheço e aceitando o desafio de os agarrar.
obrigada por tudo o que escreve, continuação de bom trabalho!
Obrigada!
Nunca pensei que houvesse leitores que visitassem os meus posts mais antigos,mas é com imensa satisfação que vejo o quanto amam os livross. Esté é também um dos meus preferidos.
Um beijo e aguardo outras visitas!
CSD
Andava aqui a "passear" no teu blog para ver que livros é que tinhas lido nesta tão fantástica empreitada, e tristemente reparei que afinal eu só "pensava" que tinha lido muitos livros... És uma leitora e tanto! Parabéns!
Até me esqueci de referir que parei aqui, porque já li "O Deus das pequenas Coisas" e adorei!
Estou espantada! Parabéns e obrigada pelo que me oferece aqui, no seu blog.
Claudia, mais um passante!
Desta vez foi o 2º aniversário da Papiro editora que motivou o meu navegar na procura!
Este Blog requer entrega estudo e opinião credível.
Adoro arte, investigação, cultura e história quanto baste.
Mas a vida acelerada não nos deixa tempo para nada.
Depende da vida de cada um, é claro!
Só que uns desperdiçam o tempo, outros não tem tempo para desperdiçar!?
Gostei muito de encontrar esta página cultural, e já a adicionei aos favoritos,por isso tenho que voltar! Vou Linkaála para o http://zemaiato.blogspot.com, penso que é minha obrigação.
Se quero e gosto!!!
Parabéns!
Muito obrigada pela visita.
Vou retribuir.
CSD
Um dos livros da minha vida. De uma beleza tão extrema e com uma intensidade dramática tão profunda que não o conseguiria descrever por palavras minhas. Mas a Cláudia consegui-o. Parabéns!
Angustiante, terrível, cru, claustrofóbico e simplesmente belo.
A paixão eleva-se ao expoente do sacrifício, mas nunca se encontra um ponto de redenção...
A vida perde todo o sentido, contudo o sentimento de ternura é omnipresente em todo o livro.
obrigada pela visita e comentários, Alexandra, José, Anónio e Anónimo!
bem-hajam... o post é antigo e, mesmo assim, é assiduamente visitado e comentado, o que me deixa muito feliz, por é uma das obras mais belas que já li até hoje.
csd
Faz um tempão da oportunidade que tive de ler essa preciosidade. Foi o primeiro livro, de muitos, quando entrei na faculdade. E lembro que ele me fez mudar muitos pontos de vista. Nunca o esqueci, e sempre indiquei para as pessoas que gosto, pois sua mensagem é linda...
Bom já faz um tempinho desde que postei este texto...(23 de Fevereiro de 2005)e mais ainda desde que o escrevi e publiquei no Jornal local da minha terra, cerca de um ano antes!
Belos tempos.
Eu escrevia ainda com alguma ingenuidade, mas lembro-me que dese tratar de uma obra de estilo invulgar, conteúdo supreendente e que explora alguns tabus...
csd
Oi Cláudia,
Também fico aqui explorando seu blog e sempre encontro ótimas resenhas.
O Deus das Pequenas coisas também me impressionou bastante... Todos os elementos que transformam uma história deslumbrante estão ali: uma cultura exótica... paixão, loucura, crueldade...
Adoro! Pensei em escrever sobre ele no meu Blog, mas acho que só vou linkar sua resenha!
=)
Beijos!
obrigada, Nanda!
csd
O Deus das Pequenas Coisas - entrei aqui por acaso e dei com um comentário sobre um livro que me persegue desde que o li pela 1ª vez e que enquanto viver vou continuar a reler vezes sem conta. É um livro sobre as diferentes formas do amor: amor entre irmãos, entre, entre mãe e filhos, entre um homem e uma mulher. Dito assim não parece nada de novo...mas o contexto em que decorre e a forma (sublime) como a autora o narra é de facto duma sensibilidade a raiar o impossível...É o meu livro!
Lis
eu tb, 10 anos depois ( ou mais?) achei esse seu post numa busca pelo livro.Parabens pelo texto!
Obrigada, Lis e Karlasie.
O livro parece ser universalmente preferido por toda a gente embora seja só o segundo mais comentado neste blogue ultrapassado por "O Velho que lia romances de amor" de Luís Sepúlveda.
Um livro realmente significativo. Eu o li e o reli. Várias vezes. A primeira vez em espanhol, quando tive contato com ele em Madrid. Posteriormente ao retornar ao Brasil, ganhei de presente e desde então tornou-se um livro de meu coração, que sempre recomendo e que me toca sobremaneira. Sempre que tenho oportunidade, presenteio-o às pessoas queridas. Denso,profundo,humano, contraditório, inquietante, doloroso, impiedoso e ... absolutamente lírico. Parabéns pela indicação e comentários.
Pois é, Caly,...Obrigada pelo comentário!
Um beijinho
csd
Este é um dos meus livros mais amado, talvez o mais. De tempos em tempos eu o releio e me emociono profundamente, pois ele tem a capacidade de se revelar a cada leitura, novos mundos, novas possibilidades, novas emoções, outras emoções.É de um fascínio absoluto e de uma intensidade arrebatadora. Uma verdadeira joia literária.
Estou a ler neste momento "O Deus das Pequenas Coisas" e estou a adorar (emitir uma opinião a meio de um livro é sempre arriscado).
Gosto da crueza com que se expõem sentimentos e com que se relata a acção, e ao mesmo tempo, gosto da delicadeza quase poética com que os mesmos sentimentos e episódios nos são contados.
Profundo, trágico e cómico (como a vida) nesta leitura sinto os ambientes, as cores, os cheiros, os personagens... tão irreais e reais ao mesmo tempo.
Obrigado pelo post (segue bastante actual, para mim, pelo menos).
Obrigada eu pela leitura!
Meu grupo de leitura vem estudando a literatura feminina e feminista ao longo deste 2020. Lemos autoras maravilhosas como Marjane Satrapi do Irã e Joumana Haddad do Líbano. Das autoras do Oriente Médio, viemos para a Índia e nossa primeira autora é Arundathi Roy da qual iniciamos a leitura de "O deus das pequenas coisas".
Pesquisando resenhas sobre ele, vim parar neste blog. Foi um achado maravilhoso, não só pelos comentários elucidativos da autora como também pelas mensagens deixadas por leitores que aqui expressam com pertinência sua ideias acerca desse romance.
Grata a todos.
Maria Lúcia Elias
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