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Sunday, January 01, 2017

"The Church Mice at Christmas" by Graham Oakley (Templar Publishing)



Um conto de Natal, publicado pela primeira vez em 1980, belamente ilustrado pelo próprio autor. A História faz parte de uma colecção de livros para crianças, que surgem em formato de banda desenhada. As imagens destacam-se pela beleza, precisão e profusão de detalhe e cor, recreando um cenário que faz lembrar a era vitoriana (a história passa-se, contudo, na contemporaneidade).

A intriga gira à volta de uma comunidade de ratinhos que habitam uma velha igreja e representam, de forma alegórica, as classes pobres e as crianças de famílias de baixos rendimentos. O gato, por sua vez, é um um protagonista silencioso - a sua voz nunca se faz ouvir nem em discurso directo, nem em discurso indirecto livre, são sempre os ratinhos que falam por ele. Na verdade, este gato não surge associado aos típicos clichés que o retratam como um predador implacável - como nas histórias de desenhos animados de Tom & Jerry - mas sim como alguém proveniente das classes privilegiadas (oriundo da burguesia ou das elites aristocráticas) e profundamente envolvido ou mesmo comprometido com um projecto de solidariedade, articulado com a comunidade dos ratinhos da Igreja. 

Trata-se de um gato essencialmente benévolo, aliado dos ratos e da luta contra a pobreza, empenhado na missão de conceder um natal mais digno e alegre, mais igual a quem tem muito pouco. Mas é também um gato com um ethos algo frágil, pois a sua boa vontade é, de certa forma, explorada pelos ratinhos; o gato acaba por se deixar manietar e objectificar pela classe menos favorecida da comunidade dos ratinhos daquela igreja que o convencem em deixar-se converter em prémio para fazerem uma rifa e assim angariar fundos para a festa de Natal.

Posto isto, acontecem depois várias peripécias ao longo da intriga: o grupo acaba mesmo por, inadvertidamente, apanhar em flagrante um falso pai natal, que entrava nas casas para roubar os haveres, que eram facilmente confundidos com presentes e ajudar a polícia a apanhar o criminoso. No final, tudo acaba em bem e tanto os ratinhos como o gato têm um Natal alegre e farto, festejado em conjunto, apesar de os ratinhos não terem grande respeito por um gato que teria feito uma espécie de 'voto de pobreza' ou 'voto de castidade' comprometendo-se a não caçar ou fazer mal a ratinho algum. 

O texto é revestido de um toque de humor negro a que não é alheio também o enquadramento ideológico do ultra-liberalismo que dominava então a Inglaterra do tempo do governo de Margareth Thatcher, imbuido de um paternalismo de elite e uma ideologia anti estado social, que não garantia grande crédito às classes populares relativamente à competência destas para a gestão de um orçamento familiar. Isto está patente não só na forma como o chefe dos ratinhos (que pode ser identificado com um líder sindical) trata com condescendência o gato filantrópico (persistia então ainda a ideia oriunda de recuados tempos vitorianos de que os criados não respeitam um patrão benevolente), mas também e sobretudo na forma como acaba a festa e são gastos os fundos angariados par a festa: excessos, bebedeira e uma grande dor de barriga para todos (excepto o gato por ter sido mais comedido e não ter grande apetite).

Mas apesar da carga ideológica, o texto não deixa de ser divertido. Sobretudo porque, nos tempos actuais, pode ser lido como paródia aos excessos do actual governo Tory e da equipa que habita o nº 10 de Downing Street: uma transposição para os hábitos populares das formas de diversão habituais entre as elites. 

As ilustrações complementam o texto escrito de forma eficaz, com uma tonalidade satírica, com as confusões causadas pelos ratinhos enquanto tentam angariar fundos para financiar a sua festa de Natal.


Um livro transversal ao tempo em que foi escrito e que hoje pode ser lido como um manifesto em favor da Igualdade, Fraternidade e Liberdade de festejar o Natal ou qualquer outra festa como lhe apetecer.


Cláudia de Sousa Dias

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