"Como Água para Chocolate" de Laura Esquível (ASA)
Tradução do Espanhol do México por Cristina Rodriguez revista por Elena Piatok de Mattos (Adida cultural da embaixada do México)
Há seis anos atrás classifiquei este livro como "um suculento best-seller que se degusta até à última página".
Talvez por falar tanto de comida. E de misturar um caleidoscópio de emoções daquilo que parece ser um melodrama do início do século XX com sabores, receitas aromáticas, com o apimentado e algo sarcástico humor mexicano.
Este é um romance construído com base num conflito entre tradição e afectos.
O cenário da acção é o México rural, do início do séc.XX. Mamã Elena é uma mulher seca, amarga, de carácter dominador, que administra o seu rancho e, simultaneamente, a sua família com mão de ferro. O seu despotismo determinará que Tita, a mais jovem das três filhas da proprietária, sacrifique a expressão e concretização dos seus afectos para cuidar da mãe durante a velhice. A despótica matriarca delibera que Pedro, o apaixonado de Tita, case com Rosaura, a filha mais velha, Mamã Elena está, nada mais nada menos, que a unir o útil ao agradável: Tita é a mais a filha mais dócil e diligente de toda a sua prole.
Mas Pedro, só aceita a imposição porque é a única forma de estar próximo da mulher que ama.
A paixão reprimida de Tita por Pedro é sublimada através da arte culinária, pois é na cozinha, ao manipular temperos e alimentos que Tita usufrui de total liberdade para exprimir o que sente. Ao elaborar pratos sofisticados, Tita projecta emoções, sufocadas por uma tradição obsoleta e desumana, na comida. Emoções que, através de um processo semelhante à osmose, são por sua vez, transferidas para aqueles que se deliciam com as iguarias da protagonista. E que neles despoletam os comportamentos mais bizarros sendo, desta forma, levados a agir segundo a perspectiva e forma de sentir de Tita.
Por exemplo: a indisposição geral que se abate sobre os convidados durante o casamento de Pedro e Rosaura, logo após ingerirem o bolo que Tita é obrigada a confeccionar. Um mal-estar que é confundido com uma invulgar e extremamente violenta intoxicação alimentar, a qual se manifesta num estrondoso vomitório colectivo. No entanto, trata-se apenas da forma como Tita gostaria de exteriorizar o que sente face ao atentado contra o livre arbítrio dos dois amantes.
Outro exemplo é o "incêndio" que deflagra no corpo de Gertrudis, a irmã domeio, após degustar um prato afrodisíaco de Tita - codornizes com pétalas de rosa - que a leva a fugir, montada na garupa á semelhança de Lady Godiva renascida, com um revolucionário.
Cada capítulo de Como Água para Chocolate é iniciado com uma receita à qual está, de algum modo, associada uma forte carga emocional.
A paixão de Tita por Pedro deixa-a mesmo "como água para chocolate" (bebida mexicana preparada com água e cacau), expressão idiomática que significa: em ponto de ebulição. Mas esta bebida só se forma quando os dois ingredientes se misturam...e o amor também, ou seja quando duas almas se fundem à temperatura da água ao formar o chocolate quente. Mas ao fazê-lo, as duas substâncias deixam de existir para formar o novo composto...
Logo que a presença gelada de Mamã Elena deixa de exercer a sua influência na livre expressão dos afectos dos dois protagonistas, a poderosa reacção alquímica ocorrida entre eles corre o risco de provocar uma combustão espontânea, idêntica ao accionar de todos os detonadores de um arsenal de explosivos como profetiza Jonh, o médico da família...
O estilo da Autora incide sobretudo num discurso onde predomina o uso da hipérbole, do exagero e até do absurdo para melhor enfatizar o ridículo da contradição ente a moral associada aos costumes e tradições – mores – e a ética fundamental e universal, que reside no livre arbítrio, no direito inalienável de cada indivíduo efectuar as suas escolhas e, com base nelas, construir a própria vida.
Um romance, que incide num tema clássico, onde o amor é negado aos protagonistas, e onde se "cozinha" muito mais do que receitas emocionais: um mundo imaginário onde ocorre a vulcanização de uma paixão proibida, dentro do género do realismo mágico, ao estilo de Jorge Amado ou Gabriel García Márquez.
Este é um romance construído com base num conflito entre tradição e afectos.
O cenário da acção é o México rural, do início do séc.XX. Mamã Elena é uma mulher seca, amarga, de carácter dominador, que administra o seu rancho e, simultaneamente, a sua família com mão de ferro. O seu despotismo determinará que Tita, a mais jovem das três filhas da proprietária, sacrifique a expressão e concretização dos seus afectos para cuidar da mãe durante a velhice. A despótica matriarca delibera que Pedro, o apaixonado de Tita, case com Rosaura, a filha mais velha, Mamã Elena está, nada mais nada menos, que a unir o útil ao agradável: Tita é a mais a filha mais dócil e diligente de toda a sua prole.
Mas Pedro, só aceita a imposição porque é a única forma de estar próximo da mulher que ama.
A paixão reprimida de Tita por Pedro é sublimada através da arte culinária, pois é na cozinha, ao manipular temperos e alimentos que Tita usufrui de total liberdade para exprimir o que sente. Ao elaborar pratos sofisticados, Tita projecta emoções, sufocadas por uma tradição obsoleta e desumana, na comida. Emoções que, através de um processo semelhante à osmose, são por sua vez, transferidas para aqueles que se deliciam com as iguarias da protagonista. E que neles despoletam os comportamentos mais bizarros sendo, desta forma, levados a agir segundo a perspectiva e forma de sentir de Tita.
Por exemplo: a indisposição geral que se abate sobre os convidados durante o casamento de Pedro e Rosaura, logo após ingerirem o bolo que Tita é obrigada a confeccionar. Um mal-estar que é confundido com uma invulgar e extremamente violenta intoxicação alimentar, a qual se manifesta num estrondoso vomitório colectivo. No entanto, trata-se apenas da forma como Tita gostaria de exteriorizar o que sente face ao atentado contra o livre arbítrio dos dois amantes.
Outro exemplo é o "incêndio" que deflagra no corpo de Gertrudis, a irmã domeio, após degustar um prato afrodisíaco de Tita - codornizes com pétalas de rosa - que a leva a fugir, montada na garupa á semelhança de Lady Godiva renascida, com um revolucionário.
Cada capítulo de Como Água para Chocolate é iniciado com uma receita à qual está, de algum modo, associada uma forte carga emocional.
A paixão de Tita por Pedro deixa-a mesmo "como água para chocolate" (bebida mexicana preparada com água e cacau), expressão idiomática que significa: em ponto de ebulição. Mas esta bebida só se forma quando os dois ingredientes se misturam...e o amor também, ou seja quando duas almas se fundem à temperatura da água ao formar o chocolate quente. Mas ao fazê-lo, as duas substâncias deixam de existir para formar o novo composto...
Logo que a presença gelada de Mamã Elena deixa de exercer a sua influência na livre expressão dos afectos dos dois protagonistas, a poderosa reacção alquímica ocorrida entre eles corre o risco de provocar uma combustão espontânea, idêntica ao accionar de todos os detonadores de um arsenal de explosivos como profetiza Jonh, o médico da família...
O estilo da Autora incide sobretudo num discurso onde predomina o uso da hipérbole, do exagero e até do absurdo para melhor enfatizar o ridículo da contradição ente a moral associada aos costumes e tradições – mores – e a ética fundamental e universal, que reside no livre arbítrio, no direito inalienável de cada indivíduo efectuar as suas escolhas e, com base nelas, construir a própria vida.
Um romance, que incide num tema clássico, onde o amor é negado aos protagonistas, e onde se "cozinha" muito mais do que receitas emocionais: um mundo imaginário onde ocorre a vulcanização de uma paixão proibida, dentro do género do realismo mágico, ao estilo de Jorge Amado ou Gabriel García Márquez.
Cláudia de Sousa Dias
Labels: Repostagem repescada do arquivo morto de Fevereiro de 2005
15 Comments:
Adoro ler as suas críticas/explicações literárias, já li o livro há muitos anos e recordo-me de ter gostado bastante, e a forma como é contada a história é inesquecível. Muito obrigada especialmente por ter explicado o título do livro. Não me recordo se no livro isso é explicado, contudo se é eu não me lembrava e adorei ter ficado a saber.
obrigada...já tinha publicado este texto há alguns anos atrás. Só não estava disponível com a última actualização do blogger, que impôs um limite de caracteres mensais. Logo, o ficheiro de Fevereiro de 2005 ficou sobrecarregado, ocultando os textos mais antigos, que tenho vindo gradualmente a repor...
Ho letto la recensione di questo libro e ho trovato quessta frase stupenda :.....una scatola di fiammiferi dentro di noi. Solo che abbiamo bisogno dell’ossigeno per accenderli. Il respiro, la parola, il sorriso della persona giusta a fungere da detonatore per l’esplosione dell’anima. Uno alla volta, altrimenti si produce uno splendore luminosissimo che illumina il tunnel che ci riporta alla perduta origine divina”.......
Ciao Claudia
Roberto
bene...
Grazie roberto.
La mia ricenzione, va un può per la stessa strada di questo pensiero...
CSD
Accendi un fiammifero uno alla volta....mi raccomando :-)
Forze, Roberto, forze...
grazzie e baci
csd
Olá Cláudia... Muito boa apresentação de um livro delicioso... Em todos os sentidos! Bem lembrado o estilo de outros querido autores latino americanos: Jorge Amado e García Marques. Porém vejo na literatura de Laura uma delicadeza feminina que falta em nossos outros admirados autores... Será privilégio da mulher falar mais perto à alma e ao coração?
Grande beijo!
Não sei Fernanda...
Mas este livro tem qualquer coisa de "o Amor nos tempos de Cólera" na parte final, assim como o humor malandro de "Dona flor e seus dois maridos"...
e amanhã já é dia de publicar outro...
csd
sim, mas é uma história consensual, sem margem para polémica...já "O amante" ou "A dor" de Marguerite Duras, não é bem assim...
não sei o que foi feito do comentário do Miguel Pestana a respeito deste post, que deu origem à minha resposta no comentário anterior. No entanto aqui vai ele, retirado do gmail.
"miGuel pesTana has left a new comment on your post ""Como Água para Chocolate" de Laura Esquível (ASA)...":
Este foi o primeiro livro que li da Laura Esquivel e fiquei fã da escrita dela. Muito incomum e original
Passa no meu blogue e ve o meu comentário.
Boas leituras "
Concordo,
O estilo é muito parecido com o de Garcia Marquez, mas na minha opinião esta obra esta muito longe da profundidade de Cem Anos de Solidão.
Já somos dois a concordar...mas eu não deixo de o dizer por outras palavras...ou, pelo menos nas entrelinhas. É uma história mais consensual, como já disse anteriormente, com menos nuances e menos complexa. Mas mesmo assim com bastante valor literário. Para além de exibir várias marcas da cultura local, como uma sociedade patriarcal, mas onde a matriarca reina dentro de casa, a cozinha como o lugar de onde emana e se cozinham as emoções, que é a alma do romance,o sentimentalismo latino,a presença do maravilhoso, etc...gostei muito do filme, também.
[contém spoiler] Claudia, o que você pensou sobre o título dos capítulos serem os meses do ano apesar da história se passar em muito mais tempo que isso? A única coisa que consegui associar foi a simbologia de janeiro com o início da vida dela e dezembro com o fim. Você pensou em algo diferente?
Parabéns pela resenha
Obrigada...eu já li o livro há muito tempo...em 2005 que foi a data do primeiro post deste texto o qual foi revisto em 2011. Mas estou a precisar de lê-lo novamente. Mas sim, tem a ver com o ciclo da vida e não com o ano em si, onde nunca caberiam acontecimentos que atravessam várias décadas.
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