“O Palácio dos Sonhos” de Ismail Kadaré (Dom Quixote)
Nascido no sul da Albânia, Ismail Kadaré inicia a sua actividade de romancista, jornalista e poeta depois de o seu país ter rompido os laços políticos com a União Soviética, reafirmando a sua soberania.
Depois de exercer a actividade como deputado na Assembleia Popular de Tirana durante doze anos, a Autor obtém asilo político em França, já no final da década de oitenta.
O romance O Palácio dos Sonhos, apesar de terminado em 1981, só é publicado pela primeira vez em França em 1990, chegando a Portugal dois anos depois.
O impacto do romance, no público da Europa Comunitária, é fortemente ampliado pelo assunto que dominava os media na altura: o conflito nos balcãs.
A acção de O Palácio dos Sonhos decorre no Império Otomano, nos finais do século XIX. Uma época efervescente, na qual o tabuleiro de xadrez político Europeu é palco do conflito de interesses entre dois gigantes imperiais com pretensões expansionistas cujas fronteiras se encontravam confinadas: o Império Otomano (a dominar praticamente toda a bacia do Mediterrâneo a oriente do Adriático) e o Império Austro-Húngaro (abarcando grande parte da Europa do Leste). O que significa que os Balcãs estão no centro do fogo cruzado e das insustentáveis tensões políticas e diplomáticas que se geram entre estes dois titãs...
...sob o olhar da águia imperial russa que aguarda pacientemente...
É este o cenário geopolítico que antecede a Primeira Guerra Mundial, despoletada pelo assassínio do Kaiser por um jovem nacionalista sérvio.
O medo irracional do Sultão em ser vítima de um golpe de estado fá-lo organizar uma vasta equipe com a tarefa de executar uma recolha exaustiva dos sonhos de todos os habitantes do Império em busca de indícios, presságios, oráculos anunciadores de uma possível tragédia seja ela de natureza natural económica ou política, embora o objectivo central seja o de detectar uma possível conspiração que vise directamente o Sultão.
O Palácio dos Sonhos é o edifício Imperial onde se recolhem, seleccionam, interpretam e arquivam os sonhos – ou o sono – de um dos mais vastos impérios à escala mundial. Organizado numa pesada superestrutura burocrática, situada num edifício cuja multiplicidade de corredores e galerias o tornam semelhante ao labirinto de Creta, e em cujas inúmeras encruzilhadas se confrontam os principais grupos rivais, à procura de um lugar de destaque na Corte governada por um soberano despótico.
Um lugar onde os sonhos mais importantes são forjados por grupos de interesses ou famílias rivais e onde os funcionários são simples marionetas. Estes são a máscara que esconde os mais sujos jogos de extorsão. O Minotauro pode estar è espreita na esquina de cada corredor ou ao abrigo de um dos gabinetes da cúpula...
A imponência, a austeridade e a atmosfera lúgubre do Palácio, banhado na profunda solidão quase autista dos funcionários, mergulhados durante horas a fio no conteúdo das suas pastas, está impressa em cada linha da escrita de Kadaré. De tal forma que o leitor quase sente o frio impiedoso do inverno de Istambul a penetrar os ossos e a entorpecer os movimentos.
A pretensão hipócrita manifestada pelas instâncias superiores do Palácio acerca do isolamento face às influencias externas, aquando da primeira entrevista do jovem Mark-Alem, esbarra directamente com o poder dos grupos de pressão, personificados pelas famílias influentes, como a Quprili à qual pertence Mark-Alem, sobrinho do Vizir. As promoções também sofrem o mesmo processo, onde o mérito conta muito pouco em detrimento dos laços de sangue. Mas a garantia de eficácia baseia-se, curiosamente, no factor sorte, que consiste em conseguir um aliado/informador privilegiado...durante a pausa para o café.
No entanto, o mesmo prestígio genealógico que coloca Mark-Alem numa posição influente é, também, o factor que o coloca na mira dos mais encarniçados e ferozes inimigos.
Acresce o facto de que, no Império Otomano, ninguém poder ser mais amado do que o próprio Sultão.
O prestígio de uma família proeminente bem como as afinidades do membro intelectualmente mais brilhante da família com o embaixador da potência rival, abrem a porta à Intriga com o objectivo de despertar o Ciúme, a Inveja e o Medo do Grande Tirano, e lançar a tragédia no seio dos Quprili...
O Palácio dos Sonhos oferece-nos a possibilidade de conhecermos um pouco mais profundamente a história da Albânia e as suas ligações face aos estados vizinhos como a Bósnia, a Turquia ou o Kosovo. E a entender as delicadíssimas e espinhosas relações diplomáticas/culturais bem como a génese dos conflitos étnicos que desembocaram em confrontos sangrentos que se estendem até à época contemporânea.
Um livro imperdível para quem deseja entender um pouco melhor os acontecimentos históricos das últimas décadas. Sobretudo para aqueles que gostariam de avaliar até onde pode chegar a prepotência da intervenção estatal quando se trata de invadir a vida privada.
Um romance que fala de sonhos roubados, dentro do palácio que é a mente de cada indivíduo.
Um grito de revolta a apelar ao direito pensar livremente.
De sonhar.
Sem medos.
Cláudia de Sousa Dias
Depois de exercer a actividade como deputado na Assembleia Popular de Tirana durante doze anos, a Autor obtém asilo político em França, já no final da década de oitenta.
O romance O Palácio dos Sonhos, apesar de terminado em 1981, só é publicado pela primeira vez em França em 1990, chegando a Portugal dois anos depois.
O impacto do romance, no público da Europa Comunitária, é fortemente ampliado pelo assunto que dominava os media na altura: o conflito nos balcãs.
A acção de O Palácio dos Sonhos decorre no Império Otomano, nos finais do século XIX. Uma época efervescente, na qual o tabuleiro de xadrez político Europeu é palco do conflito de interesses entre dois gigantes imperiais com pretensões expansionistas cujas fronteiras se encontravam confinadas: o Império Otomano (a dominar praticamente toda a bacia do Mediterrâneo a oriente do Adriático) e o Império Austro-Húngaro (abarcando grande parte da Europa do Leste). O que significa que os Balcãs estão no centro do fogo cruzado e das insustentáveis tensões políticas e diplomáticas que se geram entre estes dois titãs...
...sob o olhar da águia imperial russa que aguarda pacientemente...
É este o cenário geopolítico que antecede a Primeira Guerra Mundial, despoletada pelo assassínio do Kaiser por um jovem nacionalista sérvio.
O medo irracional do Sultão em ser vítima de um golpe de estado fá-lo organizar uma vasta equipe com a tarefa de executar uma recolha exaustiva dos sonhos de todos os habitantes do Império em busca de indícios, presságios, oráculos anunciadores de uma possível tragédia seja ela de natureza natural económica ou política, embora o objectivo central seja o de detectar uma possível conspiração que vise directamente o Sultão.
O Palácio dos Sonhos é o edifício Imperial onde se recolhem, seleccionam, interpretam e arquivam os sonhos – ou o sono – de um dos mais vastos impérios à escala mundial. Organizado numa pesada superestrutura burocrática, situada num edifício cuja multiplicidade de corredores e galerias o tornam semelhante ao labirinto de Creta, e em cujas inúmeras encruzilhadas se confrontam os principais grupos rivais, à procura de um lugar de destaque na Corte governada por um soberano despótico.
Um lugar onde os sonhos mais importantes são forjados por grupos de interesses ou famílias rivais e onde os funcionários são simples marionetas. Estes são a máscara que esconde os mais sujos jogos de extorsão. O Minotauro pode estar è espreita na esquina de cada corredor ou ao abrigo de um dos gabinetes da cúpula...
A imponência, a austeridade e a atmosfera lúgubre do Palácio, banhado na profunda solidão quase autista dos funcionários, mergulhados durante horas a fio no conteúdo das suas pastas, está impressa em cada linha da escrita de Kadaré. De tal forma que o leitor quase sente o frio impiedoso do inverno de Istambul a penetrar os ossos e a entorpecer os movimentos.
A pretensão hipócrita manifestada pelas instâncias superiores do Palácio acerca do isolamento face às influencias externas, aquando da primeira entrevista do jovem Mark-Alem, esbarra directamente com o poder dos grupos de pressão, personificados pelas famílias influentes, como a Quprili à qual pertence Mark-Alem, sobrinho do Vizir. As promoções também sofrem o mesmo processo, onde o mérito conta muito pouco em detrimento dos laços de sangue. Mas a garantia de eficácia baseia-se, curiosamente, no factor sorte, que consiste em conseguir um aliado/informador privilegiado...durante a pausa para o café.
No entanto, o mesmo prestígio genealógico que coloca Mark-Alem numa posição influente é, também, o factor que o coloca na mira dos mais encarniçados e ferozes inimigos.
Acresce o facto de que, no Império Otomano, ninguém poder ser mais amado do que o próprio Sultão.
O prestígio de uma família proeminente bem como as afinidades do membro intelectualmente mais brilhante da família com o embaixador da potência rival, abrem a porta à Intriga com o objectivo de despertar o Ciúme, a Inveja e o Medo do Grande Tirano, e lançar a tragédia no seio dos Quprili...
O Palácio dos Sonhos oferece-nos a possibilidade de conhecermos um pouco mais profundamente a história da Albânia e as suas ligações face aos estados vizinhos como a Bósnia, a Turquia ou o Kosovo. E a entender as delicadíssimas e espinhosas relações diplomáticas/culturais bem como a génese dos conflitos étnicos que desembocaram em confrontos sangrentos que se estendem até à época contemporânea.
Um livro imperdível para quem deseja entender um pouco melhor os acontecimentos históricos das últimas décadas. Sobretudo para aqueles que gostariam de avaliar até onde pode chegar a prepotência da intervenção estatal quando se trata de invadir a vida privada.
Um romance que fala de sonhos roubados, dentro do palácio que é a mente de cada indivíduo.
Um grito de revolta a apelar ao direito pensar livremente.
De sonhar.
Sem medos.
Cláudia de Sousa Dias
19 Comments:
Fiquei com vontade ...
Não li. Vou procurar
Um beijo e ... obrigada pela sugestão
Só boas sugestões e tão pouco tempo.
Bjs
Isabel e Totoia vocês são uma queridas.para além de terem blos fantásticos!
CSD
Hum...depois de ler a crítica só me consegui lembrar do "Admirável mundo Novo" de Aldous Huxley!
"Sonhos controlados", foi a expressão que me chamou a atenção. Mais uma vez uma sugestão que parece à primeira vista fabulosa!
Obrigada, Miss Alcor!Tu e a Lady Mizar estão desde já convidadas para a tertúlia que se vai realizar manhã na Biblioteca Municipal de Vila Nova de Famalicão às 21 e 30 sobre "A Insustentável leveza so ser" após a projecção do filme!
Faria muito gosto na vossa presença!
Um abraço!
CSD
Este blog é uma pérola. Críticas de excelente qualidade. Pena estarem dispersas por ordem cronológica. Talvez um site fosse mais adequado...
Só uma sugestão :)
1 abraço
Olá Armando!
Obrigada pela tua visita!
sabes aquilo que acontece é que eu vou comentando à medida que vou lendo os livros. Não comento segundo uma ordem cronológica de acordo com a data de edição das obras em Portugal...
CSD
Desculpa Claudia! Eu realmente vi o teu e-mail, e acredita que achei uma ideia fantástica! E claro que VNGaia não é assim tão longe! Mas eu não tenho carro e era-me impossível a deslocação para Famalicão aquelas horas da noite! Realmente fiquei com pena, porque nunca vi o filme e ainda não tive oportunidade de ler o livro! De certeza que foi giro!!! Mais uma vez desculpa, e obrigada pela simpatia e pela lembrança!
Amei o blog, embora ele se resuma basicamente a resumos dos livros....
Seria ideal comentários do género "vale a pena ler", "recomendo", "a não perder"!
Muitas das histórias dos livros comentados, são fabulosas, mas a escrita em si é pouco cativante! O escritor não consegue prender o leitor até ao fim!!!
Querida Miss Alcor, ~ficará para uma próxima vez!
Tenho a certeza que não faltarão oportunidades para nos conhecermos!
Um beijo
Caro Anónimo, o que acontece é o seguinte:normalmente quando acho que um livro me acrescenta de facto alguma coisa eu não deixo de o ler até ao fim, porque sou muito persistente..
..mesmo quando o ritmo da história não tem nada a ver com o de Dan Brown - o qual, independentemente da qualidade de tratamento dos temas ou do estilo literário, sabe, de facto, tecer uma trama de forma a prender o leitor...
...por isso Dann Brown é para mim uma leitura de Verão para me deleitar numa esplanada à beira-mar, em alturas em que eu não quero ler nada que me obrigue a pensar muito (lol)!
O mesmo não se passa com "O nome da Rosa" ou "O Palácio dos Sonhos" onde, se calhar a parte mais importante da mensagem está nas entrelinhas, o que obriga a uma leitura muito mais atenta. Concentrada.
Esse é o meu objectivo neste blog. Mostrar pistas de leitura para livros que, em muitos casos, à primeira, vista, não parecem ser muito cativantes.
Agora aqueles que não tem nada, que valha a pena, nem mesmo como uma boa diversão como além de Brown, J.K.Rowling (de quem ainda não comentei absulutamente nada)ou Wilbur smith, não acho que valha sequer a pena mencioná-los no blog...
CSD
olá cláudia!
fui eu quem esteve ontem com um amigo na tua biblioteca!!
eu,me,myself...
claro que não sabias... hehe mas aquilo ficou muito tarde e o meu amigo (da próxima vou sozinha...:))tinha que se levantar muito cedo...
mas fiquei a conhecer-te e um dia destes...apareço lá.
gostei de recordar aquele bocado do filme...mas bem gostaria de ter ficado para o debate.
beijO
Eu vi-te sair!
Estou lá muitas vezes mas o meu trabalho na biblioteca é em regime de prestação de serviços,por isso não estou lá sempre!
Mas na última querta-feira de cada mês às 21 e 30 é certinho!
O próximo filme eu vou dexar a cargo do público a tarefa de escolher se querem "O Código DaVinci" ou "A Última Tentação de Cristo" de Scorcese Baseado no livro de Nikos Kazantakis (para quem não sabe é também o autor de "Zorba, o Grego"). Podem começar a vitação!;-)
Beijos
CSD
Ai, quem me dera morar mais perto de Famalicão, ou pelo menos ter carro... pouca sorte!
Tens dearranjar uma boleia com alguém, Miss Alcor!
Se não estivesse a morar com os meus pais, convidava-te a ficar em minha casa...
assim por enquanto, terás de vir com aguem que more no Porto ou em Gaia..
Beijo grande!
Ainda há-de chegar o dia! O importante é não desesperar! ;
sabias que um colega meu albanês me sugeriu este autor? nem mais nem menos! parece que andas a er boas coisas!!!
olá Cláudia!!!
PArabens pelo Blog..
Tive curiosidade em passar por aqui e gostei..continua assim, mas se melhorares que seja para melhor..um beijinho grande:
Andrea
olá Cláudia!!!
Como estas?!Lembrei-me de passar por aqui e,de facto, não deixar de te dar os parabens pelo blog..continua assim e se mudares que seja para melhor..um beijinho grande Andrea
:-))
Beijinho para ti, Andrea...!
CSD
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