"Salomé" de Oscar Wilde (Planeta Agostini)
O Amor no limiar da Loucura, num vórtice passional onde se fundem as mais primitivas pulsões, recalcadas no inconsciente humano.
Oscar Wilde parte de uma história bíblica para a construção de uma belíssima peça de teatro, escrita originalmente em Francês. A estreia contou com a interpretação da mítica Sarah Bernhardt como protagonista.
A obra foi proibida em Inglaterra, tanto no tocante à publicação como à sua exibição em salas de espectáculos, por influência da ala protestante e conservadora no Parlamento que não permitia a representação de personagens da Bíblia.
A Salomé de Wilde obra é de de um dramatismo pungente, pela intensidade das emoções vertidas pelas personagens que intervém na trama, sendo pelo contrário, entusiasticamente aplaudida e aclamada na Cidade-Luz.
Olhando a obra do ponto de vista psicanalítico podemos, talvez, inferir que a construção do perfil psicológico das personagens nela contidas reflecte a controversa sexualidade do autor, isto é, uma homossexualidade camuflada, a par de uma misoginia mais do que evidente.
A corroborar o facto, podemos observar que todas as características do ideal de beleza física deWilde estão presentes na figura de João Baptista que é, para o autor, o (seu) verdadeiro objecto de desejo enquanto que este (Wilde) se projecta na figura de Salomé como a personagem que seduz, possuidora da aparência física que ele próprio idealiza como fazendo parte do eterno feminino e que ele próprio gostaria de poder ostentar (daí a malícia de Beardsley ao retratá-lo na imagem da perversa rainha Herodias, na célebre edição que foi destruída pelo Ãutor).
A faceta misógina do Oscar Wilde decide atribuir a Salomé a beleza de uma mulher fatal, mas diáfana, a qual ele identifica com a Lua - símbolo que personifica a ambiguidade e, simultaneamente, a fronteira entre a realidade e a loucura - facto ilustrado pelos presságios, evidentes em vários momentos deste drama intensíssimo, quando as personagens são advertidas do perigo de sucumbir à perda da razão pela excessiva contemplação da Lua (Salomé).
Porque a Lua, tal como a Princesa Real, possui uma face oculta (ao fim e ao cabo como o próprioWilde em relação à sua própria sexualidade, camuflada sob a capa de um casamento com e dois filhos). Esta ambiguidade apresenta-se em Salomé, na ausência total de limites quanto à satisfação dos seus desejos a que se opõe uma sua aparência angelical e inocente, a principal característica susceptível de enlouquecer quem por ela se deixa enfeitiçar.
Ao longo da peça vai sendo progressivamente desvendado o ambiente propício à tragédia, assinalada por presságios e pela ocorrência da morte daqueles que contemplam demasiado a figura lunar da Princesa Real. João Baptista é o único que salva a alma porque se abstém de a contemplar, agarrando-se firmemente à adoração do Filho do Homem para escapar à periculosidade da sedução feminina.
Mas não consegue salvar a vida. João Baptista cai no erro de humilhar alguém que sente a turbulência de um primeiro amor, que ele não compreende, e que se propõe a condenar sem piedade. Não esqueçamos que João Baptista é apenas humano. Não possui a perfeição espiritual de um filho directo de Deus. A Lua, que empresta a sua sedução à figura de Salomé e orgulho vingativo, na sua faceta de Hécate, reage violenta e passionalmente à rejeição, tirando a vida ao ser amado para concretizar aquilo o que não consegue realizar com ele vivo: o beijo que lhe foi negado.
Salomé, está impregnada do universo que povoa o inconsciente deste polémico autor britânico, com um complexo cocktail de pulsões, fobias, desejos ocultos, tabus sexuais e contradições que emanam do conflito entre o id, o ego e o superego do autor projectado nas personagens.
Salomé é a própria personificação do Desejo, das pulsões que são, normalmente, "castradas" pela religião, representada e defendida com uma paixão de verdadeiro fundamentalista, por João Baptista.
Uma história de amor, loucura e morte que Oscar Wilde legou para a posteridade e que obriga o leitor\espectador a reflectir acerca dos limites da paixão e da tolerância.
Cláudia de Sousa Dias
Olhando a obra do ponto de vista psicanalítico podemos, talvez, inferir que a construção do perfil psicológico das personagens nela contidas reflecte a controversa sexualidade do autor, isto é, uma homossexualidade camuflada, a par de uma misoginia mais do que evidente.
A corroborar o facto, podemos observar que todas as características do ideal de beleza física deWilde estão presentes na figura de João Baptista que é, para o autor, o (seu) verdadeiro objecto de desejo enquanto que este (Wilde) se projecta na figura de Salomé como a personagem que seduz, possuidora da aparência física que ele próprio idealiza como fazendo parte do eterno feminino e que ele próprio gostaria de poder ostentar (daí a malícia de Beardsley ao retratá-lo na imagem da perversa rainha Herodias, na célebre edição que foi destruída pelo Ãutor).
A faceta misógina do Oscar Wilde decide atribuir a Salomé a beleza de uma mulher fatal, mas diáfana, a qual ele identifica com a Lua - símbolo que personifica a ambiguidade e, simultaneamente, a fronteira entre a realidade e a loucura - facto ilustrado pelos presságios, evidentes em vários momentos deste drama intensíssimo, quando as personagens são advertidas do perigo de sucumbir à perda da razão pela excessiva contemplação da Lua (Salomé).
Porque a Lua, tal como a Princesa Real, possui uma face oculta (ao fim e ao cabo como o próprioWilde em relação à sua própria sexualidade, camuflada sob a capa de um casamento com e dois filhos). Esta ambiguidade apresenta-se em Salomé, na ausência total de limites quanto à satisfação dos seus desejos a que se opõe uma sua aparência angelical e inocente, a principal característica susceptível de enlouquecer quem por ela se deixa enfeitiçar.
Ao longo da peça vai sendo progressivamente desvendado o ambiente propício à tragédia, assinalada por presságios e pela ocorrência da morte daqueles que contemplam demasiado a figura lunar da Princesa Real. João Baptista é o único que salva a alma porque se abstém de a contemplar, agarrando-se firmemente à adoração do Filho do Homem para escapar à periculosidade da sedução feminina.
Mas não consegue salvar a vida. João Baptista cai no erro de humilhar alguém que sente a turbulência de um primeiro amor, que ele não compreende, e que se propõe a condenar sem piedade. Não esqueçamos que João Baptista é apenas humano. Não possui a perfeição espiritual de um filho directo de Deus. A Lua, que empresta a sua sedução à figura de Salomé e orgulho vingativo, na sua faceta de Hécate, reage violenta e passionalmente à rejeição, tirando a vida ao ser amado para concretizar aquilo o que não consegue realizar com ele vivo: o beijo que lhe foi negado.
Salomé, está impregnada do universo que povoa o inconsciente deste polémico autor britânico, com um complexo cocktail de pulsões, fobias, desejos ocultos, tabus sexuais e contradições que emanam do conflito entre o id, o ego e o superego do autor projectado nas personagens.
Salomé é a própria personificação do Desejo, das pulsões que são, normalmente, "castradas" pela religião, representada e defendida com uma paixão de verdadeiro fundamentalista, por João Baptista.
Uma história de amor, loucura e morte que Oscar Wilde legou para a posteridade e que obriga o leitor\espectador a reflectir acerca dos limites da paixão e da tolerância.
Cláudia de Sousa Dias
Labels: Repostagem repescada do arquivo morto de Fevereiro de 2005
8 Comments:
Comentários publicados na Primeira versão deste texto, datada de Fevereiro de 2005:
Winny said...
Parabéns pelo seu texto, é tão difícil encontrar alguém que tenha esta visão a respeito de tão bela adapatação Salomé, que Oscar Wilde reescreveu.
1:34 AM
Claudia Sousa Dias said...
Obrigada, Winny!
Este foi um dos livros que mais me deu prazer comemntar.
Há pouco tempo enviaram-me por e-mail o original publicado em francês, o qual foi poucoi depois traduzido por um amigo do Autor para a versão inglesa.
Isto porque a peça estreou com a lendária Srah Bernhardt em Paris...
Quem me dera later estado, em plena Belle Époque...
CSD
5:25 PM
Claudia Sousa Dias said...
e que aconteceu aos restantes 21 textos postados a 23 de Fevereiro de 2005?
CSD
9:18 PM
Nós na Rua said...
maravilho! parabéns adorei o seu comentário é magnífico!
1:00 AM
Claudia Sousa Dias said...
Obrigada, Nósna Rua!
é muito raro encontrar alguem que não só tenha lido este belíssima peçade Wilde como também a tenha comentado e feito sobre ela qualquer tipo de apreciação!
csd
10:47 AM
De Wilde só li, há 2 décadas, o incontornável "Retrato de Dorian Grey" e gostei muito, sobretudo pelo imenso que se depreende nas entrelinhas!
Beijinhos e parabéns pelas sempre excelentes críticas!
Madalena
Blog extraordinário, mesmo! Espero que continue!! Fazem falta blogs assim, muita falta! Descobri por acaso e cá voltarei ;)
obrigada...e seja bem vindo a esta pequena biblioteca virtual...
Um beijinho, M!
obrigada...
Oscar Wilde é uma das paixões da minha vida, apenas para me privar de dizer a maior. É interessante é a análise que você colocou em cima dessa peça que pode parecer simples, a princípio, pelo enredo, mas, que não só analítica, como filosoficamente falando, nos rendem impressões e percepções da ideologia transmitida e interpretada pelo querido autor. É necessário frisar que desde sempre os textos de Oscar costumam abordar o assunto que tem com ênfase a beleza, e com ela, suas consequências, o que de certa forma chega a ser irônico, mas mais irônico seria que não o fosse se tratando de Oscar Wilde, não? Gostaria de parabeniza-la e agradecê-la por fazer jus a peça não apenas pela sua história, mas pelo seu contexto histórico e principalmente pelo seu autor. Numa obra com tanto coração como esta, é impossível dizer que a maior parcela deste trabalho seja um pedaço do próprio autor.
Obrigada, Oldconsciousness...é óptimo trocar ideias e comparar pontos de vista sobre os livros. É um dos objectivos deste blogue. Para além de dar a conhecer os autores e respectiva obra. Ou chamar a atenção para este ou aquele Autor menos divulgado mas com um importantíssimo contributo para a literatura universal.
Ola! Adorei o que escreveu! Estou num momento lindo de estudo dessa obra e do universo de wilde
Seria incrível trocar impressões c vc!
Muito me interessa também se vc puder me encaminhar esse texto em original francês e em ingles!
Seria de grande valia para minha pesquisa!
Obrigada
Segue meu email
Bellatrix.Cs@gmail.com
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