“A Ninfa Inconstante” de Guillermo Cabrera Infante (Quetzal)
Tradução de Salvato Telles de Meneses
1.Dados Biográficos:
Guillermo Cabrera Infante nasceu
em Cuba a 22 de Abril de 1929, tendo falecido em Londres, a 21 de
Fevereiro de 2005, em consequência de um acidente doméstico que lhe
fracturou a anca. Filho do jornalista Guillermo Cabrera e Zoila
Infante, ambos militantes comunistas e fundadores do partido. Este
facto levou a família à prisão, ainda durante a ditadura de
Baptista, juntamente com o jovem Cabrera Infante que contava
então com apenas sete anos. As origens de Infante remontam,
no entanto, às Canárias, mais propriamente à ilha de La Palma,
lugar de onde partiu a sua família para Cuba, em 1941.
Aos dezoito anos, o Autor publica o seu
primeiro conto: El Señor Presidente. Chegou a estudar
Medicina, mas desistiu do curso para estudar Jornalismo. Em 1950,
acabou por especializar-se em Literatura e Cinema, paixão que é
projectada em todas as suas obras publicadas. Em 1952, os censores do
governo de Baptista acusam-no de obscenidade, baseando-se na análise
de um conto que Autor havia escrito naquele ano. Foi proibido de
publicar com o próprio nome, dificuldade que contornou, recorrendo
ao uso de um pseudónimo. A partir de 1954, começa a trabalhar na
revista Carteles, facto que é referido pelo narrador do
romance A Ninfa Inconstante de que hoje aqui falamos. O
romance é autodiegético, sendo o narrador e protagonista um
alter-ego do próprio Autor, apesar de se tratar de uma obra de
ficção. A protagonista feminina é, por sua vez, a projecção
idealizada das divas do cinema europeu dos anos 60 da nouvelle
vague. Na altura em que escreveu o romance, o Autor assinava
ainda o pseudónimo de Guillermo Cain (Caín, em espanhol, o filho de
Adão, preterido por Deus, tal como o Autor é preterido pelo regime
de Baptista; é, também, a contracção dos dois apelidos do Autor
Cabrera e Infante), até 1960.
Foi ao longo da década de 50 do século
XX que o Autor escreveu a maior parte dos seus contos, os quais
viriam a integrar o volume Así en la paz, como en la guerra.
Casa-se em 1953 com Marta Calvo, de quem tem duas filhas. Em 1958,
conhece a actriz cubana Miriam Gómez com a qual viria a casar três
anos mais tarde, após conseguir obter o divórcio de Marta.
Com a Revolução e a ascensão de
Fidel Castro ao poder , em 1959, o Autor, que havia apoiado a mesma,
foi nomeado Director do Conselho Nacional de Cultura, tornando-se
director executivo do Instituto de Cinema e subdirector do diário A
Revolução tendo a seu cargo o Suplemento Literário, no qual
podia dar largas às suas aspirações de liberdade ,
desenvolvimento e promoção da Cultura. Porém, as suas relações
com o regime cedo se deterioraram devido, em grande parte, à curta
metragem rodada por Orlando Jiménez Leal e pelo próprio irmão do
Autor, Saba Cabrera, em finais de 1960. O filme da discórdia
chamava-se P.M., a história não tinha propriamente uma
estrutura definida e descrevia as mais ousadas formas de diversão de
um grupo de habaneros (à semelhança do enredo de Três
Tristes Tigres, de que já aqui falamos), ao longo de vinte e
quatro horas, em finais de 1960. A película foi proibida por Fidel
Castro que, no seu discurso de 30 de Junho de 1961, intitulado
Palabras a los Intelectuales deixava bem claro que: “Dentro
de la Revolución, todo. Fuera de la Revolución, nada.” Foi a
primeira pedra lançada para a edificação do castelo de motivos que
estiveram na base do exílio do Autor. Em 1962, Guillermo Cabrera
Infante é enviado a Bruxelas como adido cultural da embaixada
cubana. Durante a permanência naquele país, escreveu Um ofício
do século XX (1963). Regressa a Cuba, após a morte da mãe, em
1965. Ali, é detido pelo serviço da Contrainteligência, durante
quatro meses, período após o qual é exilado, juntamente com a
família, em Espanha. Mas as dificuldades económicas e o antagonismo
do regime franquista traduziram-se na recusa do governo espanhol em
regularizar a situação naquele país, forçando-o a exilar-se em
Londres, onde se instala definitivamente. Em 1968, já a viver na
capital britânica, publica Trés Tristes Tigres, uma versão
melhorada de um anterior romance, Vista del amanecer del tropico.
Trés Tristes Tigres foi prémio Biblioteca Breve em 1964, um
livro cuja principal característica inovadora consistia na
introdução de expressões idiomáticas e coloquialismos tipicamente
cubanos, contendo também inúmeras alusões e referências a outras
obras literárias, ao mesmo tempo que retratava a vida nocturna de
três jovens, naturais de Havana, em 1858. Em Cuba, a obra é
rotulada de contra-revolucionária. GCI, sendo um crítico
implacável ao regime castrista, recusa-se então, a lapidar as suas
obras Trés Tristes Tigres e Havana para um Infante
Defunto, dentro da linha editorial exigida pelo Ministério da
Cultura de Cuba. No início de 1970, instala-se em Hollywood, para se
dedicar à actividade de guionista para a indústria cinematográfica.
Em 1979, obtém a cidadania britânica. Vence o Prémio Cervantes em
1997, e o Prémio Internacional da Fundación Cristobal Gabarrón,
na categoria das Letras, em 2003. Devido ao estado frágil da sua
saúde, é internado no Hospital de Londres, em consequência de uma
fractura na anca, acabando por contrair septicemia da qual viria a
falecer. A sua morte não foi notificada em Cuba.
O Estilo de Cabrera tem
um conjunto de marcas características das quais se salientam os
constantes avanços e recuos no tempo, como se dançássemos uma
rumba com o tempo da diegese. Também a paranomásia, as hipérboles,
os regionalismos e expressões típicas do linguajar cubano, de que
já falamos a propósito de Três
Tristes Tigres estão
também presentes em A Ninfa Inconstante.
Na construção do
“eu” narrativo é, também, perceptível a presença da
melancolia, associada à influência dos blues
norte-americanos e do jazz que impregna a noite tropical
cubana, reflectida no discurso do narrador. Um subtil sentido de
humor é recheado de fina ironia e acutilante sarcasmo que se mistura
a esta disposição de espírito – a pedra de toque da escrita de
Guillermo Cabrera Infante.
Os capítulos de A
Ninfa Inconstante são narrados como se fossem crónicas, o
que transmite a falsa ilusão de se tratar de um livro de
memórias,apesar de ser evidente, o cunho autobiográfico e a
projecção de muitos dos aspectos da vida e gostos pessoais do Autor
no romance, o qual verte para a escrita as derivações emocionais de
quem se encontra em processo de divórcio.
Entre as personagens principais do romance a distância
cultural e a capacidade de entendimento entre o narrador e a
protagonista feminina são abissais. Logo desde o primeiro capítulo,
o leitor apercebe-se de que o artista e a sua musa nunca serão
amantes cúmplices: ao paternalismo do narrador, opõe-se o discurso
de Stella, algures entre a inveja e o desprezo desdenhoso patente no
sarcasmo das frases com as quais reduz a pó a o pedantismo cultural
do amante:
«Esmagas-me
com o teu conhecimento».
O
vasto conhecimento cultural de GCI
é aqui projectado na
figura do narrador, um homem de meia idade que se apaixona
perdidamente por uma adolescente para compor uma personagem que tem
mais de patético do que de admirável ou, se quisermos, para traçar
uma caricatura, uma paródia de si mesmo, como atesta o parágrafo que se segue:
«A pele dela era a sua fronteira. Por detrás havia um mundo obscuro, cruel, uma selva selvagem e misteriosa. Ela, como todos os territórios inexplorados, atraía e assustava ao mesmo tempo. Fui eu que a descobri, mas a sua exploração (nunca fui capaz de falar de conquista,) foi custosa. Só me salvou o meu instinto de conservação.»
«A pele dela era a sua fronteira. Por detrás havia um mundo obscuro, cruel, uma selva selvagem e misteriosa. Ela, como todos os territórios inexplorados, atraía e assustava ao mesmo tempo. Fui eu que a descobri, mas a sua exploração (nunca fui capaz de falar de conquista,) foi custosa. Só me salvou o meu instinto de conservação.»
Neste romance, o protagonista é um homem que cede completamente à beleza desta jovem mulher, apesar de fazê-lo apenas como esteta, já que não lhe encontra nenhum atributo de personalidade. Passa a viver em função do seu objecto sexual, à semelhança de Humbert Humbert, o protagonista de Lolita, de Vladimir Nabokov. O paralelismo entre a imaturidade de Stella e Lolita é evidente, apesar desta última ser muito mais jovem do que os quinze anos de Stella, quando é seduzida por Humbert. Contudo, a diferença entre ambos os protagonistas masculinos é mais do que evidente: Humbert Humbert planeia meticulosamente a aproximação a Lolita, ao passo que o protagonista de Cabrera Infante é um homem que se deixa levar pelos acontecimentos. E Stella, ao contrário de Lolita, sabe exactamente o que deseja: sair da área de influência da madrasta e viver a vida como muito bem deseja usando o(s) amante(s) como plataforma de lançamento. A relação entre ambos vai-se diluindo, esboroando. Algo que se adivinha desde o início do romance, previsível pela construção dialógica do par amoroso.
As
intertextualidades, presentes no romance estão patentes em alusões
e referências culturais que lembram as figuras míticas ligadas ao
cinema da nouvelle vague,
tais como a identificação trejeitos, posses e expressões verbais
de Stella com cenas da sétima arte, provenientes sobretudo de filmes
europeus: por exemplo, a comparação sistemática da forma de vestir
de Stella e a forma de pentear o cabelo louro platinado com o estilo
de Brigitte Bardot,
assim como a menção feita a vários filmes de Jean-Luc
Goddard.
Segundo
o escritor e crítico Fernando Savater,
«Guillermo Cabrera
Infante ha cultivado en el más alto grado el sentimiento cómico de
la vida: pero no como el apuesto al sentimiento tragico , sino como
una variante que lograva al purificarle del superfluo al patetismo de
la seriedad.»
Este
é precisamente o caso de A Ninfa Inconstante,
romance no qual o autor cultiva um humor mesclado com o drama
profundo em que vive o narrador e o precipita na teia intrincada da
personalidade inquietante de Stella, a qual decide recorrer à sua
beleza de mulher fatal para manipular o amante e libertar-se do jugo
familiar.
Mas quem é Stella Morris, a heroína do romance? A jovem é dona de uma beleza perturbadora, rebelde, com a sensualidade à flor da
pele e plena consciência do efeito que o seu físico desperta no
sexo oposto (e não só), tirando o máximo partido do seu corpo para
conseguir os seus objectivos. Stella é menor, órfã, e nutre um
incomensurável ódio pela madrasta, como resultado de um
enraizadíssimo complexo de Elektra. O ódio é tão intenso que a
jovem deseja intensamente a sua morte, chegando a tentar aliciar as
pessoas a assassiná-la.
Uma desconcertante mistura de perversidade e inocência faz da jovem
Stella Morris uma figura inquietante, solar, pela forte energia que
dela emana, e ao mesmo tempo lunar, pelas oscilações de humor e
instabilidade ou inconstância que demonstra ao longo do romance. O
primeiro momento em que aflora o lado sinistro da sua personalidade,
dá-se quando tenta convencer o amante a matar a madrasta; depois, há
uma outra variante desta faceta que vem à luz do dia sempre que
Stella se sente de certa forma diminuída face ao namorado. Por outro
lado, seu lado frágil manifesta-se na incapacidade ou inabilidade,
devido à falta de ausência de desenvolvimento de competências para
sobreviver sozinha, ou seja, sem recorrer ao uso do corpo para fins
sexuais.
O Autor tem, no entanto, o cuidado de enquadrar o comportamento
idiossincrático de Stella, a qual não consegue, devido a sua
imaturidade, evitar tornar-se uma mulher-objecto, apesar dos esforços
olímpicos em mostrar-se com uma mulher emancipada. Stella veste de
maneira extremamente ousada, mesmo para os padrões da época e do
local – estamos a falar de Varadero, localidade voltada
essencialmente para o turismo balnear – deixando a maior parte do
corpo a descoberto e, por vezes, sem usar roupa interior.
Stella é a Brigitte Bardot do Malecón (a marginal de
Varadero), sofisticada mas primitiva e com um forte instinto sexual,
tal com a personagem de Roger Vadim de E Deus criou a
Mulher, embora lhe seja acrescentado um toque da fleuma
anglo-saxónica.
A figura de Stella é, assim, construída e modelada partindo de um
conjunto de referências literárias e cinematográficas que servem
de base ao desenvolvimento da trama. A primeira pista é-nos
fornecida logo na nota prévia do Autor, aludindo a Guy de Maupassant (que se lê
mot passant), ou seja, a ninfa inconstante que é Stella é a
figura central de um romance onde se cruza o legado do vários
mestres que trabalham a palavra. E é talvez por essa razão que os
críticos descrevam este romance como “uma obra de elegância
formal inusitada”.
O romance: Um amor efémero
O amor vivido com Stella, a ninfa inconstante de que fala o narrador, é catalogado, logo no primeiro capítulo,
como sendo um amor de curta duração ao introduzir o comentário do
narrador: «a cigarra só vive um Verão». No romance, Stella
representa o protótipo do eterno feminino. A sua figura está
associada à Lua caribenha, símbolo máximo da beleza e feminilidade
para a cultura ocidental. Stella é quase sempre representada como
uma espécie de ídolo, acompanhada por vezes de uma aura espectral e
irreal que confere ao romance uma dimensão, de certa forma, próxima
ao surrealismo. Algumas das cenas co-protagonizadas pelo narrador e
por Stella dificilmente se consegue destrinçar se pertencem ao plano
do sonho ou da vigília, como é o caso em que o narrador entra em
casa da madrasta. O leitor nunca chega a ter a certeza se aquilo que
sucedeu naquela vivenda ocorreu de facto. É precisamente nesta cena
que Stella surge com uma certa aura fantasmal ou uma deusa infernal,
Hécate, com os seus sinistros rituais sanguinários. Ela surge
precisamente como “a deusa à luz da Lua”, que é , ao mesmo
tempo, “fulgurante como um dom do sol”, surgindo ao amante,
irresistível e fatal, despertando um amor que inflama mas que
rapidamente se consome.
O romance adquire uma dimensão erótica, sobretudo na descrição da
primeira noite de amor com Stella, virgem e impúdica.
«A insolência dela não era uma máscara.»
Porque Stella não tem a menor noção de pecado, o seu comportamento
está muito para além do erotismo, é mais uma forma, um protótipo
de ideal feminino numa dada época, meados do século XX,
mostrando-se ora ingénua, ora sedutora e, por fim, manipuladora. Não
é, no entanto, capaz sequer de traçar uma fronteira entre o bem e o
mal sendo os contornos destas duas ideias perfeitamente móveis e
elásticos na mente da jovem. Trata-se de uma figura feminina que
parece mais atrair como uma planta bela mas venenosa. Logo nas
primeiras frases é perceptível que o narrador não ama a criatura,
fisicamente perfeita, que deseja de forma assaz obsessiva:
«Eu era apenas um esteta. Tinha-me refugiado na literatura como
se me acolhesse o chão sagrado, na sua igreja laica, o jornalismo. O
esteticismo é o último refúgio do fracasso da vida.»
Esta é a chave do sentimento por Stella, que o narrador irá
descrever ao longo do romance e o trilho pelo qual o Autor marcou o
rumo da própria vida.
De um outro ponto de vista, A Ninfa Inconstante é, também um romance que fala de um ser que está a viver um período de transição e não apenas no aspecto pessoal como já foi dito: o protagonista masculino está inserido numa sociedade em que se assiste a uma série de mudanças, sociais, culturais e políticas, embora esses aspectos não apareçam declaradamente mencionados no livro.
De um outro ponto de vista, A Ninfa Inconstante é, também um romance que fala de um ser que está a viver um período de transição e não apenas no aspecto pessoal como já foi dito: o protagonista masculino está inserido numa sociedade em que se assiste a uma série de mudanças, sociais, culturais e políticas, embora esses aspectos não apareçam declaradamente mencionados no livro.
A Ninfa Inconstante é, assim, a recriação de todo um estilo de vida numa época já distante do tempo presente em que é escrita, recriando uma paisagem que já não existe tal, quando se refere ao aspecto da cidade tal como nos é apresentada no livro: do Malécon e das principais ruas de Havana e o estilo de vida então praticado pelos seus habitantes. E é, sobretudo, a narrativa da evocação de um lugar e das sensações a ele associadas pela memória de quem vive no exílio.
«Esta narração está sempre no presente, apesar do tempo dos verbos, que não deixam de ajudar para criar, para fazer crer (jogo semântico-fonético com os verbos crear e creer, no original, que se lêem de forma muito similar em castelhano) no passado. Uma página, uma página cheia de palavras e de signos tem de ser percorrida e esse trajecto faz-se sempre agora, no exacto momento em que escrevo a palavra “agora” que depois vai ser vida. Mas a escrita tenta forçar a leitura a criar um passado, a crer nesse passado – enquanto esse passado narrado vai em direcção ao futuro.
(…)
Haverá momentos em que o olho que lê não acreditará no que vê. A isso chama-se ficção. Mas é sempre necessário que o leitor confunda o presente da leitura com o passado do que narra e que os dois tempos progridam em busca de um futuro que é a culminação da narração (gosto de rimas impensadas). Mas é preciso notar que toda a narração é flash-back.
(…)
GCI, A Ninfa Inconstante, Prólogo.
Escrever é assim, na perspectiva do Autor, o contrário de esquecer. Escrever é, portanto, memória como atesta o parágrafo inicial do primeiro capítulo:
«O passado é um fantasma que não é preciso convocar com médiuns ou invocar com abra-essa-obra. É na realidade da recordação um ravenant total. Não é preciso pôr as mãos em cima da mesa, de palmas para baixo, ou responder aos três toques rituais ou perguntar «Quem vem lá?». O espírito do passado está sempre a vir. Um copo de água e uma flor amarela chegam. Não é necessário repetir frases encantatórias ou cast a spell: todos os mortos estão aqui, vivos, exibidos por trás de uma janela de vidro preto, de uma câmara escura, de uma obra de artifício. Os entes passados estão vivos porque para nós não morreram. Estamos vivos porque eles não morrem. Nós somos os mortos vivos».
É assim que Guillermo Cabrera Infante escreve com a voz do exílio. Convocando o seu paraíso perdido.
«O passado é um fantasma que não é preciso convocar com médiuns ou invocar com abra-essa-obra. É na realidade da recordação um ravenant total. Não é preciso pôr as mãos em cima da mesa, de palmas para baixo, ou responder aos três toques rituais ou perguntar «Quem vem lá?». O espírito do passado está sempre a vir. Um copo de água e uma flor amarela chegam. Não é necessário repetir frases encantatórias ou cast a spell: todos os mortos estão aqui, vivos, exibidos por trás de uma janela de vidro preto, de uma câmara escura, de uma obra de artifício. Os entes passados estão vivos porque para nós não morreram. Estamos vivos porque eles não morrem. Nós somos os mortos vivos».
É assim que Guillermo Cabrera Infante escreve com a voz do exílio. Convocando o seu paraíso perdido.
07.09.2012-26.05.2013
Cláudia de Sousa Dias
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