HÁ SEMPRE UM LIVRO...à nossa espera!

Blog sobre todos os livros que eu conseguir ler! Aqui, podem procurar um livro, ler a minha opinião ou, se quiserem, deixar apenas a vossa opinião sobre algum destes livros que já tenham lido. Podem, simplesmente, sugerir um livro para que eu o leia! Fico à espera das V. sugestões e comentários! Agradeço a V. estimada visita. Boas leituras!

My Photo
Name:
Location: Norte, Portugal

Bibliomaníaca e melómana. O resto terão de descobrir por vocês!

Wednesday, September 21, 2005

“Danças e Contradanças” de Joanne Harris (ASA)


No dia do lançamento do livro, na FNAC do Norteshopping, em 9 de Novembro de 2004, Joanne Harris afirmava que as personagens da obra foram inspiradas nas pessoas que foi conhecendo durante as suas viagens. Como boa observadora da natureza humana, serviu-se dessa qualidade para, a partir do modelo real, construir as figuras dos seus contos e romances.

A Autora confidenciou, durante o lançamento de Danças e Contradanças, que a necessidade de escrever nasceu da sua tendência para a introspecção. Sendo franco-britânica e, por isso, produto de duas culturas, foi obrigada a, desde idade muito precoce, dividir o seu tempo entre um país e outro. Por este motivo, JH sofreu as consequências de ser rotulada de outsider – forasteira – que impediu a sua total integração. “Era, normalmente olhada com uma certa dose de desconfiança e vista como a Estrangeira Perigosa – The Dangerous Foreigner”.
Segundo ela, as pessoas olham, normalmente, com suspeita todo aquele ou aquela que se atreve a ser diferente, que se recusa a deixar-se levar pela maré.

O isolamento relativo daí decorrente, obrigou-a a aprimorar as suas capacidades de observação que, aliadas a uma imaginação prodigiosa, ajudaram-na e muito, a impulsionar os primeiros passos na carreira literária.

Para JH, Danças e Contradanças é uma colectânea de contos que fala de magia e monstros. Interiores e exteriores. E da sua relação com todos aqueles com quem contacta, mas sobretudo da relação consigo própria.

A Autora refere que escrever Chocolate foi como uma terapia, um ponto de viragem na carreira. Com Vinho Mágico, que fala de uma espécie de elixir da amizade, sentia o peso da responsabilidade de repetir o sucesso anterior, facto que transparece na obra, nomeadamente, no desejo da personagem principal. Já Cinco quartos de Laranja ocupa-se da recuperação do passado, enquanto que A Praia Roubada – a obra que demorou mais tempo a escrever (quatro anos) – foi orientada pela preocupação com o confronto entre desenvolvimento económico e ecologia. Em Na corda Bamba, JH inspirou-se na personalidade de um colega da faculdade para construir o vilão “LeMerle”.
No entanto, Danças e Contradanças é a obra que expõe o lado mais sombrio da personalidade da Autora. E também a sua obra mais pessoal, intimista, onde foram projectados os seus desejos e as suas fantasias mais secretas.

Os temas são ousados e variadíssimos.

Fé e Esperança vão às compras mostra que o envelhecimento físico não se estende à mente. A vaidade, o gosto pelas coisas belas, a sede de conhecimento e o espírito crítico continuam intactos.
A Irmã Feia trata da síndrome da irmã relegada para a obscuridade, em contraste com o protagonismo da Bela. Aqui dá-se uma inversão de papéis. A beleza nem sempre corresponde a uma personalidade cativante…A linguagem com que é caracterizada a irmã bela é depreciativa, tal como em muitas das restantes short stories em que a beleza aparece como algo de ofensivo e, quase sempre, aliada à estupidez, frivolidade e mau feitio.
Gastronomicon é um caldeirão de magia contido num livro de cozinha. Uma mulher que se esforça por agradar a um marido exigente, mas convencional e sem imaginação. O sentimento de inferioridade em relação à sogra – a Mulher Perfeita. Rival e, ao mesmo tempo, fada-madrinha, esta oferece à protagonista uma arma de sedução poderosíssima, recheada de exóticos feitiços gastronómicos – um livro de receitas árabe. Que só não resulta porque o parceiro não está à altura. Um conto suculento.
Falso Ouro é uma estória de soberba, cobiça e inveja. O ciúme do brilhantismo alheio num professor avaro em reconhecer o talento dos seus alunos. Ciúme esse que se manifesta num desejo desmedido e irreal de fama e protagonismo.
O Curso de 1981, o encontro das colegas do curso de magia – um divertido cocktail de venenos e maledicências. E onde a verdadeira amizade e solidariedade têm de ser procuradas à lupa. Onde se fala da perda dos poderes mágicos que pode ser identificada com a perda do magnetismo sexual (Ex: a incapacidade acender uma vela usando os poderes sobrenaturais pode significar a incapacidade de conseguir despertar sensações eróticas no parceiro!).
Olá, Adeus manifesta o ridículo face ao falso glamour, uma paródia às revistas cor-de-rosa como Hello (a protagonista trabalha para a Goodbye, note-se a ironia). O culto obsessivo da imagem, das marcas, a anorexia. O desprezo pelas relações sociais pelas relações sociais fora dos parâmetros da estética. O sarcasmo é a nota dominante.
Um espírito livre mostra o percurso assassino do maior dos psicopatas – um vírus mortífero que passeia displicentemente pela Europa e se diverte a enumerar as vítimas que colecciona.
Auto-de-fé personifica a inveja no masculino, transformada em violência física e verbal, ao volante de um carro. Uma válvula de escape para todas as frustrações.
O Espectador enuncia uma fábula futurista que explora o medo psicótico incutido nas crianças, sempre que estas se deparam com um adulto desconhecido.
O Mundo de cabedal de Al e Christine é uma estória divertida com uma pitadinha de perversão maliciosa…Ingenuidade, traição e vingança são os ingredientes…
O último comboio para Dogtwon revela um mundo onírico onde a vida de um escritor mundialmente reconhecido e a das suas personagens se confundem a ponto de, a dada altura, não se saber quem escreve o conto…
O gene G-sus é a estória mais complexa desta colectânea. Onde se procede à análise química e genética do factor G que transforma o chumbo em ouro, ou seja, a crueldade em bondade. A genética ao serviço da causa divina. A reencarnação como redenção ou punição. Final altamente polémico de sabor levemente herético.
Em Um lugar ao sol está, mais uma vez, patente a temática da beleza física como desenvolvimento de Olá, Adeus. O culto do corpo e a obsessão doentia pela beleza que serve de instrumento de ascensão social nas praias brasileiras, onde os utilizadores são seleccionados ou excluídos pelo seu aspecto físico. Uma reprodução do sistema de castas indiano? Ou um incentivo à eugenia herdado directamente das teorias raciais da História?
Chá com pássaros é um autêntico manual de bom relacionamento com os vizinhos. Um estória de grande beleza e humanidade. Um chá verde vindo do extremo oriente com um ligeiro travo a saudade.
Pequeno-almoço no Tesco’s é a sátira relativa a Pequeno-almoço na Tiffanny’s onde se analisam os factores que levam uma mulher a sujeitar-se às maiores humilhações e à privação da liberdade por medo à solidão. O cinema como terapia ou lugar do sonho.
Venha Mr.Lowry, chegou a sua vez torna real o sonho impossível perante a lei das probabilidades ou a fortuna que se transforma em ruína.
À espera de Gandalf faz-nos ver a estreita linha que separa o sonho e a fantasia da vida real. Utilização de uma paródia a Midsummernight dream para criticar a violência nas ruas de Londres.
Qualquer miúda pode ser uma miúda bom-bom mostra como a utilização do vestuário como veículo de expressão dos desejos e fantasias mais secretas, pode expor as crianças em demasia. A autora pretende, com esta estória, chamar a atenção para o conteúdo sexual explícito, presente na roupa para crianças.
A Pequena Sereia é uma estória de dor, como a de Andersen. Onde se explora o universo dos afectos no mundo dos deficientes, sujeitos ao olhar crítico ou piedoso, mas sempre cruel dos “normais”. Onde se trata da inutilidade do sacrifício em prol de um amor não correspondido.
Peixe é a estória de fazer crescer água na boca. As tentações de Nápoles. Ou, mais uma estratégia de sedução pelo estômago. Gula e malícia. Um toque de luxúria. Só para Gourmets.
Nunca Beijes um Vampiro prova que os novos vampiros não vêm da aristocracia nem sugam sangue, mas extinguem-nos a vitalidade. Uma metáfora sobre a exploração no trabalho.
Eau de Toillette é um conto de época, passado em Versalhes, num período onde os hábitos de higiene não eram democratizados e, por isso, grassava a necessidade de substituir a beleza natural pela artificial. Objectivo: esconder a sujidade. Ou a falta de saúde…

Um crítica feroz a quem rege a sua vida pelo superficial.

Uma bofetada com luva de pelica a todas as formas hipocrisia e frivolidade.

O primar do Ser em detrimento do Ter.


Cláudia de Sousa Dias

0 Comments:

Post a Comment

<< Home